domingo, 27 de setembro de 2009

FUI!




Estou saindo do blogspot e o novo endereço do Uma Pitada a Mais é umapitadaamais.wordpress.com . Lá poderão encontrar a 4ª crônica da série Vou de Ônibus. Divirtam-se e nos vemos por lá!

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

AS AMARRAS IMPEDITIVAS - 2ª PARTE




Coincidências incríveis têm acontecido ultimamente. O último post gerou diversos comentários, que julguei muito construtivos. No domingo, fui ver UP, da Pixar, e me deparei com um filme repleto de referências à história do cinema, muitas das quais não reconheci por não ter visto os filmes. A obra da Pixar, já cotada por muitos como o melhor filme do ano até então, é o tipo de filmes para todas as idades, mas com qualidade inimaginável. Bem, o filme merecerá um post exclusivo mais tarde. Só quero salientar que o caráter polissêmico de UP é responsável por uma apreciação geral, independente da idade. Mesmo assim, não captei muitas das referências.

O outro fato incrivelmente relacionado ao post anterior foi a coluna de Marcelo Gleiser, no caderno Mais, da Folha de S. Paulo. Geralmente leio este caderno por último. Primeiro pelo fato de trazer pautas frias (matérias não necessariamente relacionadas ao que está acontecendo) e segundo por ter uma linguagem mais rebuscada e sofisticação dos temas.

Bem, chega de papo. Para acrescentar a tudo que já foi dito por mim e pelos ilustres visitantes desse blog no post abaixo, exponho, na íntegra, o texto de Marcelo Gleiser:


+Marcelo Gleiser

Ciência e liberdade


Nunca se deve aceitar algo só porque foi dito por uma autoridade


Já que esta coluna cai na véspera do dia da Independência, achei oportuno revisitar um tema que está sempre presente na vida da gente: a questão da liberdade. Claro que, nestas breves linhas, eu não teria a pretensão de apresentar muitos pensamentos profundos sobre o que significa ser livre. Convido apenas os leitores a uma reflexão, iluminados, como sempre, pela luz da ciência.

Quando era garoto, gostava muito de citar a seguinte frase: "Ser livre é poder escolher ao que se prender". Outra versão é: "Quanto mais chaves você carrega no bolso, menos livre você é". Não há dúvida de que a primeira é mais filosófica. (Acho que é atribuída, talvez erroneamente, ao filósofo francês Jean-Paul Sartre.) Mas ambas dizem algo de semelhante: que liberdade e escolha andam de mãos dadas.

Existem, certamente, situações em que isso não é verdade: pessoas "presas" não por terem cometido algum crime, mas por serem aprisionadas por alguma ideologia que lhes é imposta. Por exemplo, as crianças que nascem em famílias ultrarreligiosas nunca têm a opção de refletir sobre os valores que lhes são impostos. Mesmo sem carregar chaves, estão presas até crescerem o suficiente para poder (ou não) se rebelar. O mesmo ocorre com os indivíduos que vivem em regimes políticos totalitários, onde a "verdade" é controlada pelo Estado.

Ou seja, a frase "ser livre é poder escolher ao que se prender" pressupõe que o indivíduo tem a liberdade de escolha. Isso nem sempre é verdade. Para sermos livres, precisamos ter livre acesso à informação. Só assim teremos o privilégio de poder escolher ao que vamos nos prender.

Daí o papel fundamental da educação, contanto que livre de censuras ideológicas. Já em torno de 50 a.C., o poeta romano Lucrécio celebrava a importância da educação na liberdade das pessoas. Sua preocupação era com a excessiva superstição dos romanos, que atribuíam tudo o que ocorria à ação de algum deus. Consequentemente, a maioria da população vivia aterrorizada. Só aqueles que usam a razão para desvendar o porquê das coisas podem de fato ser livres, dizia.

Só quem reflete sobre as causas das coisas, em vez de atribuí-las cegamente a causas sobrenaturais, é livre dos medos que assombram a vida. A educação deve fornecer ao indivíduo a capacidade de reflexão crítica, a habilidade de saber fazer perguntas e não de aceitar passivamente tudo o que lhe é dito. Essa habilidade, esse ceticismo, é um dos aspectos mais cruciais do treinamento de um cientista. Nunca se deve aceitar algo só porque foi dito por uma autoridade.

Essa atitude é exatamente oposta ao que ocorre em culturas conservadoras e repressivas. Mesmo que a ciência busque uma ordem no mundo material, sua essência é anárquica. Os grandes revolucionários da ciência, Copérnico, Galileu, Kepler, Newton, Einstein, Bohr, foram todos anárquicos a seu modo. Todos defendiam a sua liberdade de pensamento acima de tudo, recusando-se (ou quase, no caso de Galileu, sob ameaça da Inquisição) a aceitar o saber das autoridades. Para eles, ser livre é ter a coragem de pensar por si mesmo sobre os grandes problemas, na tentativa de chegar a uma verdade aceita pela maioria.

Quando penso em liberdade, penso nesses nomes, e em tantos outros -cientistas ou não- que lutaram para que hoje possamos ter a visão de mundo que temos. Se hoje somos mais livres, devemos agradecer a eles. Se há tantos longe de ser livres, é porque ainda temos muito o que fazer.


MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "A Harmonia do Mundo"


[ artigo publicado na Folha de S. Paulo de 06/09/2009, caderno Mais]

sábado, 5 de setembro de 2009

AS AMARRAS IMPEDITIVAS





Para compreender certas manifestações artísticas é preciso se desvencilhar das amarras


Nessa última semana, fui ver O Anticristo, novo filme de Lars Von Trier, diretor dinamarquês dos elogiados Dogville e Dançando no Escuro e criador do Dogma 95. O filme, polêmico desde a produção, está bem avaliado pela crítica especializada, mas, mesmo entre os mais politizados, tem causado certa repugnância por ser, dizem, pesado demais, apelativo e alguns acusam o diretor de ser sexista. De fato, são várias cenas “fortes”. Já era de se imaginar que, se a mão de Von Trier era pesada fazendo dramas políticos, no gênero terror uma acentuação de tal característica provavelmente iria ocorrer. E esse é o filme: câmera na mão, atuações profundas e cenas penetrantes.


Aviso que quem for assistir ao filme verá sexo explícito, aborto animal e automutilação. Devo crer que só a presença de um desses elementos já afastaria muita gente da sala de cinema. E caso muitos fossem ver, é fácil dizer que choveriam exclamações do tipo “Nossa, que horror!”, “Pra quê isso?”, “Olha, achei péssimo, como você me indica um filme desses?!“. Enfim, frases do tipo tia-avó descontextualizada. Na verdade, esse tipo de manifestação muitas vezes revela uma dificuldade de compreensão ou, talvez mais precisamente, uma dificuldade de aceitação para com o que é mostrado. E o grande problema é que, cada vez mais, percebe-se que “não entender é meio passo para não gostar”, o que é lamentável. Por que uma cena de sexo explícito tem que durar 11 minutos? Por que tem que mostrar o sangue? Existe isso? (essa é uma das piores).


Filmes como O Anticristo e tantos outros não são filmes fáceis. Costumam ser difíceis de digerir, densos e constantemente incomodam a plateia – no caso do gênero terror (e horror), um dos objetivos é justamente esse; incomodar. No entanto, incomodar mera e simplesmente dificilmente faz um grande filme ou uma grande ideia. Afinal, pra quê ir ao cinema simplesmente para se sentir mal? O “x” da questão é que quase sempre há um sentido para o incômodo. A arte muitas vezes representa pensamentos, acontecimentos, e estados de espírito de diversas formas: metaforização, hipérboles, analogias com o fantástico, sinédoques etc. Por que às vezes é difícil que elas sejam assimiladas? Porque muitas são extremas e destoam do que estamos acostumados a ver. Pronto, caímos na velha discussão sobre a dificuldade de entender o que é diferente.


Não conseguimos aceitar - e consequentemente entender- certas coisas porque estamos presos às amarras impeditivas.


Amarra é igual a “rabo preso”, que não existe apenas no mundo administrativo e político, mas também no campo intelectual ou ideológico. Ter uma filiação partidária é também um exemplo de amarra ideológica, por exemplo. Ser de outra época pode se tornar uma amarra caso a pessoa em questão não consiga abrir os olhos para os novos tempos. O fanatismo, o gosto por coisas determinadas, o desgosto pelo resto e o preconceito são outros exemplos. Qualquer tipo de ligação de caráter inabalável com algo, como ter uma religião ou uma crença inatingível, também é uma baita amarra.


Vejam, não estou dizendo que ninguém pode ser religioso, militante partidário ou gostar apenas de rock. Apenas exponho esses elementos para exemplificar a maneira como as pessoas são facilmente situadas num campo e se prendem a ele. Nesse sentido, tais elementos funcionam como “algemas”, impedindo que horizontes distintos se expandam. Situações do dia-a-dia servem de amostra: para um metaleiro, um cd classificado como forró é pior do que o classificado como Heavy Metal, mesmo sem que ele conheça ambos. Se eu pedir a um islâmico para que leia o livro de Richard Dawkins, é bem provável que ele me deseje os mármores do inferno só ao ler o título : Deus, um delírio.


Explicando melhor, não sou contra correntes, até porque estou preso a diversas delas. Sou, sim, contra correntes inquebráveis. Se nossa conexão com alguma coisa é impossível de ser desfeita, tendemos a tratar o oposto ou o diverso como o “errado”. Isso acontece frequentemente na nossa relação com a Arte, ao assistirmos, por exemplo, um filme que nos mostra coisas estranhas, longes do nosso universo, como é o caso de O Anticristo.
Exibo duas frases com significâncias extremamente relacionadas com o assunto:



"Uma pessoa para compreender tem de se transformar."
( Antoine De Saint Exupery )


"Temos de renunciar ao mundo para o compreender."
( Jean Grenier )




É isso. Para entender, temos que aceitar e para aceitar temos que nos desvencilhar de algumas amarras. Após esse processo, aí sim podemos exercer melhor o esperado julgamento do “gostei ou não gostei”. Do contrário, se estivermos sempre presos a algo, a aceitação inexiste, ou ocorre de forma forçada. Não reconhecendo e procurando entender o diferente, não se estabelece o diálogo. E sem diálogo não há produção de conhecimento.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Vou de ônibus - III - Onde está a Carol?

Carol? Você está aí?



Entre as tragédias e comédias que vivemos e ouvimos dentro de um ônibus, diversas beiram o fantástico e estampam fatos que podem parecer impossíveis de acontecer. Coisas para serem transmitidas no "Assombrações",da Discovery Channel ou até em The Mentalist, CSI e outros suspenses policiais.

Era uma sexta-feira, à noite, e estava voltando da faculdade. O ônibus com destino certo para a minha casa parou e minha tristeza veio rapidamente quando percebi que ele estava lotado. Sem maior alarde, porém, subi e tratei de já ir para o fundo. Afinal, se é pra brincar de tropa de choque, melhor jogar já, até porque não sabia quantas pessoas mais iriam subir no veículo.

Após aquele sacrifício típico, consegui chegar ao fundo e ficar próximo à porta. O ônibus foi enchendo de uma forma que eu tinha a impressão de que, 5 pontos após eu subir, não tinha decido ninguém ainda, enquanto alguns milhares de cidadãos deviam ter embarcado.

A expressão facial e os olhares diziam o mesmo de sempre: "estamos cansados, trabalhamos o dia inteiro e apenas queremos chegar em casa!".

Tinha tudo para ser mais um dia normal de ônibus cheio. Mas não! Subiram no ônibus algumas garotas. Não consegui vê-las por motivos óbvios: havia, mais ou menos, umas 40 cabeças na minha frente. No entanto, pude ouvi-las. Elas simplesmente não conheciam o conceito de silêncio. Nada contra conversar, mas desde que em tom baixo, já que se encontravam num transporte público, lotado de pessoas morrendo de sono e com caras de múmias reumáticas. Não, as "amigas" falavam alto, com um timbre irritante e quase gritando. Pareciam combinar algum compromisso para o dia seguinte e também pareciam querer tornar o convite público.

Para minha surpresa, elas não demoraram muito para chegar ao fundo e, então, pude avistá-las e perceber que estavam com mochilas nas costas. Não deviam ter mais que 16 anos.

Conversa vai, conversa foi, até que uma delas percebeu que faltava alguém no time:

Menina 1: - Ué, cadê a Carol?

Menina 2: - Nossa, cadê a Carol, meu?

Menina 3(4957684576045 decibéis): - CAROOOOOOOOOOOOLLLLLLLLL!!!!!! VOCÊ TÁ AÍ????????

Menina 2(4957684576045 decibéis): - OH CAROOOOOOLLLLLLL!!!!!

Menina 1: - Calma gente, ela não deve ter conseguido passar, deve estar lá na frente.

Menina 2: - AH, olha ela lá! ( apontou pra frente e viu que Carol acenava, como se quisesse dizer para esperarem, pois ela já estava indo).

Menina 3: - Achou ela aí?

Menina 2: - Ela tá vindo!


Conversa vai, conversa foi...

Menina 1: - Meu, por que a Carol ainda não veio?

Menina 2: - Nossa, é mesmo neh!

Menina 1: - Meu, cadê a Carol, cara?

Menina 3: - Nossa, não é possível!

Menina 2(4957684576045 decibéis): - OH CAROOOOOOOOOOOLLLLLLLLL!!!!


(ninguém responde)

Menina 1: - Meu, tá chegando no ponto, cadê a Carol?

Menina 3: - Não to vendo ela! Ela tava lá agora mesmo(aponta para perto do cobrador, onde se encontrava Carol alguns minutos antes).

Menina 1(4957684576045 decibéis): - OH CAROL, A GENTE VAI DESCER!!!!

(ninguém responde)

Menina 2: - E agora? A gente não pode descer sem a Carol!

Menina 3: - Mas ela não tá aqui, só pode ter descido!

Menina 1: - Liga pro celular dela, neh der!


( A Menina 3 tentou ligar, mas parece que ninguém atendia)


Menina 2: - Meu, vamos descer! Já passou um ponto do nosso!


(as 3 meninas desceram preocupadas)




Não sei quem é essa tal Carol que desapareceu. Mas fico imaginando o que aconteceu com ela. Talvez ela seja a única pessoa de bom senso "do grupinho" e tenha resolvido se retirar após cansar de ouvir gritos dentro de um ônibus.


Para ilustrar uma noite já peculiar, sobe no ônibus um vendedor de trufas, com uma cesta cheia delas. Não parecia ser diferente do tipo que já conhecemos; aquele que discursa que podia estar roubando ou matando, mas está dignamente tentando arrecadar fundos para voltar pra Bahia. No entanto, o vendedor causou espanto ao anunciar os sabores das trufas que vendia:

Vendedor: - Tem 10 sabores de trufas: Brigadeiro, Coco, Morango, Chocolate, Chocolate Branco, Brigadeiro, Café, Nozes, Rum e Brigadeiro.

(as expressões dos passageiros revelavam uma sensação curiosa: "estou muito cansado ou ele repetiu 3 vezes o brigadeiro?")

Como todo vendedor, ele ia passando pelo ônibus e repetindo o discurso, até que disse pela 2ª vez os sabores:

Vendedor: - Tem 10 sabores de trufas: Brigadeiro, Coco, Morango, Chocolate, Chocolate Branco, Brigadeiro, Café, Nozes, Rum e Brigadeiro.

(algumas feições de espanto se transformavam em um sorriso, um riso contido, uma pequena gargalhada)

Repete pela 3ª vez:

Vendedor: - Tem 10 sabores de trufas: Brigadeiro, Coco, Morango, Chocolate, Chocolate Branco, Brigadeiro, Café, Nozes, Rum e Brigadeiro.



AChei sensacional! Também vou vender trufas,Na hora de anunciar os sabores, direi:

- Tenho 10 sabores de trufas: Brigadeiro, Brigadeiro, Brigadeiro, Chocolate, Alpino, Nozes, Brigadeiro, Café, Brigadeiro e Rum. Ah não, tenho 11. Faltou um: brigadeiro!



Juro que não tinha trocado. Se tivesse comprava uma trufa. Adivinhem de que sabor.


Esse merecia!



Chegou o meu ponto e desci!






Trufa de Brigadeiro!

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O exotismo de André Gide

O escritor André Gide



O francês André Gide era filho de pais protestantes e deixa claro, por meio de suas poesias, a infância triste e solitária que teve. Homossexual assumido, ele sempre lutou contra qualquer tipo de moralismo ou puritanismo. Seus poemas ficaram marcados pelo exotismo.

Por acaso, nesses dias, li algo extraordinário desse autor: Os Frutos da Terra. Sem dúvida foi um dos textos que mais me impressionaram. O livro é quase um poema em prosa e aborda os nossos sentidos em contato com a natureza, tudo com um entusiasmo raro. A obra não deixa de lado o erotismo e a sensualidade.

Deixo na coluna ao lado o poema Copo de Água.

domingo, 26 de julho de 2009

Difícil? Que bom!

"A televisão me deixou burro, muito burro demais" - Arnaldo Antunes


Muitos estão cansados, esgotados e não suportam mais ver programas ruins na TV Aberta. Na Globo, líder da audiência, os mesmos apresentadores de sempre inovam muito pouco e as novelas estão cada vez piores: tramas fracas, superficiais, personagens ocos, diálogos ruins e mal interpretados. Num ato de desespero consequente da falta de criatividade, os autores e diretores apelam para os "atores de segurança", aqueles que interpretam qualquer papel e podem dar à novela um maior tom dramático ou humorístico.

Assim, nas últimas novelas tem sido comum ver Lília Cabral ou Tony Ramos, por exemplo, sendo usados para as chamadas "cenas de efeito": carente de argumentos, o roteiro cede espaço para o melodrama, que ocupa grande tempo de cena e se sustenta graças ao talento de atores que, colocados em primeiríssimo plano pelo diretor, facilmente nos fazem rir ou chorar. Tais acontecimentos muitas vezes não são significativos para a história e não encontram grande motivação artística. Mas o que isso interessa? Afinal, estamos no mundo das novelas e o modelo folhetinesco necessita de pontos no Ibope todos os dias, não se pode bobear.

Colocar Lília Cabral chorando ou Tony Ramos fazendo palhaçadas é fácil em todos os sentidos. Fácil para o autor, para o diretor, para os atores(os "de segurança", é claro) e o principal: FÁCIL PARA O PÚBLICO ENTENDER, SE EMOCIONAR E SE IDENTIFICAR, ou seja, AUDIÊNCIA!

No entanto, há de se questionar o mérito artístico. O que a novela tem a acrescentar? O que podemos aprender com ela ou, se argumentarem que não é preciso ensinar(e não é mesmo), o que ela traz de novo, de realmente interessante? Por que o mero entretenimento não pode ter mais qualidade?

Como não gosto de generalizações, digo que não são todos os autores que nos infernizam com novelas de péssima qualidade. Silvio de Abreu sabe criar ótimas tramas e é ótimo escritor de humor. Manoel Carlos sempre nos traz bons diálogos(diferentemente de melodramas baratos) e seus personagens são fortes. Mas creio serem exceções. Atualmente, o horário nobre da Globo é, em grande parte, ocupado pelo folclorismo podre de Glória Perez e derivados.

Tendo em vista toda essa lógica imperante nas grandes redes de televisão aberta do Brasil, devo imaginar o quão difícil é a aprovação de projetos ousados por parte dos diretores de programação e empresários.

MAS.............


como nem tudo está perdido, a própria Rede Globo nos surpreende às vezes. De vez em quando, surgem coisas como Hoje é dia de Maria, Capitu e, mais recentemente, Som & Fúria. Este último acabou na última sexta e seus 12 episódios trouxeram luz às trevas, exibindo uma produção impecável e um texto delicioso. Adivinha: sucesso de crítica e pouca audiência, mesmo destino já experimentado por Capitu e outras.

A Minissérie perdeu até para os filmes de Steven Seagal na Record, um verdadeiro fracasso de público. Provável motivo: " é difícil para as pessoas", diriam alguns.

Se Capitu, de Luiz Fernando Carvalho, "dificultava" pela estrutura e por uma opção dramatúrgica rebuscada e incomum na TV popular, Som & Fúria, adaptado de um texto canadense por Fernando Meirelles, "dificulta" pelo tema, teoricamente distante do "grande público": o cotidiano de uma Cia Teatral pública.

Então, logo vem os "cornetas do além" dizendo que a massa popular, o povão, não pode compreender uma arte mais complexa, sendo assim, os programas de TV deveriam se rebaixar se quiserem ter audiência.

PURA BOBAGEM!

O grande público tem dificuldade de acompanhar obras mais difíceis porque não está acostumado. Falta-lhe cultura. E não é tirando as oportunidades de assistir às séries de qualidade que o problema será resolvido.

Por isso, a Globo deve insistir, procurando dar espaço para produções independentes e novos talentos da dramaturgia.

Sim, isso pode ser muit utópico e muitos dirão : " A Globo e as outras grandes empresas televisivas não estão preocupadas com a falta de cultura do povo."

Discordo. Se isso fosse verdade, pessoas como Luiz Fernando Carvalho não teriam espaço.

Além disso, as novas tecnologias, como a internet, não param de segmentar o público. Preocupar-se apenas com o ibope, produzindo porcarias, fará com que as redes de TV percam parte do público mais intelectualizado, como já está acontecendo. Além disso, subestimar a capacidade do "povão" pode ser um erro, pois a audiência já provou ser um fenômeno cíclico, submetido a idas e voltas.

Num cenário como esse, é imprescindível possuir uma programação diversificada que atenda a vários gostos. Do contrário, aquele que não está satisfeito vai procurar o produto que deseja em outro lugar. E, com as opções de hoje, ele tem onde achar.




O bom elenco de Som & Fúria, acompanhado do diretor Fernando Meirelles. Um verdadeiro colírio em tempos de Glória Perez.




Os personagens Bentinho e Capitu, na minissérie adaptada do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, e dirigida pelo criativo Luiz Fernando Carvalho. Lindeza rara.



Abaixo, poesia já publicada aqui, de Maiakovski:




Incompreensíveis para as massas

Wladimir Maiakovski


Entre o autor e o público, posta-se o intermediário.

E o gosto do intermediário
é bastante intermédio, medíocre.

Medianeiros médios pululam nos meios, onde, galopando, teu pensamento chega.
Um deles considera tudo sonolento:
"Sou homem de outra têmpera! Perdão",
e repete um só refrão:
"O público não compreenderá".

Camponês, só viu um faz tempo, antes da guerra.
Operários, deu com dois, uma vez, numa ponte, vendo subir a água da enchente.

Mas diz que os conhece como a palma da mão.
Que sabe tudo o que querem!
Aqui vai meu aparte: chega de chuchotar bobagens para os pobres. Também eles, podem compreender a arte. Logo, que se eleve a cultura do povo!
Uma só, para todos.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Genialidade?





























Apesar de não ser tarefa muito fácil, muitos já tentaram definir o conceito de genialidade. Anos depois, alguns consensos: gênio seria aquele com capacidades mentais fora do comum, podendo chegar ao brilhantismo. Pode ter tanto um intelecto extraordinariamente grande ou um talento criativo incomum. Claro, muitos gênios desenvolveram também incapacidades, muitos ficaram loucos ou tinham obsessões, compulsões e outros distúrbios. Mas o que os fez serem chamados de geniais era a diferença entre seus intelectos e os da maioria.

Schopenhauer dizia que os gênios são aqueles cujo intelecto prevalece sobre a vontade de forma muito forte.

Kant usava a ideia de aprendizagem para explicar a genialidade. Para ele, o gênio seria independente na compreensão de conceitos, não precisando que alguém o ensinasse.

Pois bem, eis que estou lendo a coluna de Mônica Bergamo na Folha de S. Paulo(Sábado) quando me deparo com uma notícia assustadoramente sensacional: a revista Galileu está preparando um especial sobre "gênios brasileiros". Até aí, ótimo, sensacional a iniciativa. O assustador: dentre os gênios que serão perfilados na edição, estão Boninho, o diretor do BBB, e Chimbinha, o topetudo guitarrista da banda Calypso.


Fui conferir a informação( vai que a Mônica não dormiu direito no dia) e era isso mesmo.



Chimbinha
e Boninho: gênios brasileiros.


Obs: o perfil de Boninho está sendo escrito pelo lírico Pedro Bial. Aliás, por que não colocaram o Bial lá também? Quem sabe a Xuxa?


Bem, como nenhum comentário meu seria capaz de expressar o quanto eu passei mal ao ler a notícia, apenas proponho uma reflexão: Anatol Rosenfeld fez um grande e completo estudo sobre os gêneros literários, mas, pesquisando os gêneros humorísticos, pude chegar à conclusão de que nenhum deles chega perto do tamanho abstracionismo cômico no qual a realidade se tornou.



Chimbinha, guitarrista e parceiro da cantora Joelma na banda Calypso.





Pedro Bial e Boninho, este último considerado um gênio brasileiro pela revista Galileu, da editora Globo (opa... ah, deve ser coincidência).