domingo, 26 de abril de 2009

A vida começa aos 70?

Segura o cara! Ou melhor, não segura não...


O ano era 2007. Quem acompanhava a premiação do Globo de Ouro, em janeiro daquele ano, pode ver Warren Beaty, 72, subir ao palco para receber o prêmio Cecil B. DeMille, homenagem feita pela Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood àqueles que construíram uma grande e influente carreira cinematográfica. Ou seja, é, em seu conceito, um prêmio para artistas que "já deram" muito ao cinema; diretores ou atores de certa idade que estão, de certa forma, aposentados. Beaty,emocionado, subiu ao palco e fez um dos discursos mais lúcidos e impressionantes que já vi. Disse que se orgulhava de seu legado artístico, de seus prêmios e agradeceu às pessoas que possibilitaram toda a sua brilhante carreira. Afirmou que houve um momento de sua vida em que ele sentiu que estava envelhecendo: a imaginação não fluía, os roteiros passaram a ficar desleixados, as atuações preguiçosas etc. Logo após, desviou os olhos em direção a Clint Eastwood, sentado numa das mesas da frente pois concorria duplamente como melhor diretor por "Cartas de Iwo Jima" e "A Conquista da Honra". "Clint, eu tenho ódio de você!", disse Beaty, arrancando risadas da plateia. "Você é mais velho que eu, fez muitos mais filmes que eu e ganhou mais prêmios que eu. Tem a carreira dos sonhos e, ao invés de estar vivendo numa casa perto de um lago, fumando um charuto e bebendo whisky, você me faz dois filmes sobre a 2ª Guerra, abordando dois pontos de vista diferentes, viajando pelo mundo para realizar tomadas difíceis e, além de tudo, ainda faz a trilha sonora", completa o premiado. Clint, visivelmente sem graça, apenas acenava elegantemente.


A verdade é que Beaty estava certo. Clint Eastwood é ator desde o começo da década de 50. A maioria de seus filmes eram de baixo orçamento, filmes B, nos quais fazia sempre o mesmo papel: o cara macho, durão, rude e que estava acima da lei. Nunca foi grande ator, mas teve oportunidade de conviver com ótimos diretores, como Sérgio Leone. Fez muitos faroestes e teve em Dirty Harry um de seus grandes personagens. Tendo tudo isso em vista, a Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood deu a Eastwood o Cecil B. DeMille, em 1988. Afinal, Clint tinha 58 anos e, provavelmente, ninguém esperava muito dele.

E...

poderia ficar 456874506475864705867406 anos aqui escrevendo, mas as imagens dizem melhor o que Clint fez depois disso:



Dirigindo Forest Whitaker, em "Bird", biografia de Charlie Parker. O curioso é que ele ganhou o próprio globo de ouro de melhor diretor, além de indicação à Cannes, um ano após ter ganhado o "prêmio dos aposentados"
Aos 62, dirige e atua em "Os Imperdoáveis". Chovem prêmios, como o Oscar de filme e diretor para o velho.
Aos 65 anos, dirige e atua com Meryl Streep em "Pontes de Madison"
Só dirigindo agora, aos 73. "Sobre meninos e lobos" também foi muito premiado e Clint se consagrava com um cinema de 1ª.
74 anos. Dirige e volta a atuar em "Menina de Ouro". Premiações despencam: Clint repete a dobradinha no Oscar e leva Direção e Filme. Hilary Swank leva o Oscar de atriz.
Aos 76, Clint faz filme sobre heroísmo que discute o que é o heroi verdadeiro e o fabricado. Tema muito semelhante ao último post deste blog. De novo, chovem prêmios.
Ainda aos 76: filme falado em Japonês. Talvez um dos mais lindos filmes de Clint. E dá-lhe prêmios de direção pro cara.
Aos 78, dirige Angelina Jolie, em "A Troca"
78 ainda. "Gran Torino", que filme! Mais uma vez, Clint dirige a si mesmo e ajuda na trilha sonora.





ACABOU?





NÃO!

Olha o cara aí! Atualmente dirigindo Matt Damon, num filme sobre Nelson Mandela, que será interpretado por Morgan Freeman. O velho não para!







Não é apenas aumento de produção. Clint só melhora, fez seus grandes filmes após os 70. Como diretor, é um dos melhores da atualidade; trata de temas profundos com um toque esteticamente classicista, equilibrado, sendo reconhecido pela sua habilidade na composição de planos. Longe dos mandamentos hollywoodianos, Clint é um diretor sem medos, não se acomoda, vai atrás de conhecimento puro e realista para compor seus filmes. Já atingiu uma maturidade que lhe permitiu filmar os temas que quer, da maneira que quer(muitos o consideram pessimista), com uma segurança ímpar, que transparece para os espectadores que notam a concisão da direção nos filmes de Eastwood. ARTE das grandes.


Que o cara viva e faça cinema até os 200 anos.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Onde estão os heróis?

Superman


Tema preferido de estúdios hollywoodianos e de histórias em quadrinhos. Figura frequente em grandes épicos. Para alguns uma bobagem romântica, para outros uma necessidade: o heroísmo.



Muitos sociólogos já criticaram a sociedade ocidental pela necessidade de se ter um herói e um inimigo. Não é a toa que essa é a abordagem de várias coberturas jornalísticas: se não há um herói e um bandido, vamos inventá-los. Assim, há personalidades que ganham o status de herói, muitas vezes exagerado, por representarem algo de benéfico para a sociedade. Vários esportistas se enquadrariam aí: Pelé, Senna, Guga e até aquele obeso que usa a atual 9 do Corinthians. Na política, aqueles que simbolizam mudanças, sinal de novos tempos e avanços democráticos também são tratados com tal honraria. É o caso de Obama e, para muitos, Lula. Com os inimigos, ocorre da mesma forma: Bin Laden, Saddam, Hitler e outros são "figuras do mal" na óptica da maior parte do ocidente.

Se não há um verdadeiro herói por força dos fatos, o roteiro cria um. A mesma coisa ocorre com o inimigo. Ou seja, criam-se heróis falsos e irreais, enquanto há a satanização de outros. Louva-se Daguerre por ter inventado a fotografia, mas todos os cientistas anônimos que possibilitaram diversos avanços favoráveis à fixação da imagem no século XVIII são esquecidos. Assim como a fotografia, o telefone, a TV, o computador e muitas outras invenções não são obra de uma pessoa só, e sim resultados de um processo longo que contou com a participação de muitos indivíduos.

Mesmo assim, acredito em heróis. Creio que existem certas pessoas que mudaram concepções e influenciaram pensamentos por poder de suas individualidades. Sem dúvida, Pelé tinha grande equipe ao seu lado, mas fez coisas inimagináveis, não é apenas consequência de um bom sistema. Ghandi não só pensava de forma peculiar, como também convenceu pessoas e enfrentou hierarquias baseado em uma visão de mundo muito particular. São heróis.

Muitas vezes, os heróis são associados à predestinação. São "os escolhidos", assim como Neo, de Matrix.

Não sei. Mas pensando em heróis, fui procurar os meus. Será que tenho algum? Será que minha geração tem heróis? Eles estão em falta? Afinal, precisamos deles?


é...




Tenho ídolos. Mas aí é diferente. Muitos deles até podem ser heróis. Ainda assim, John Lennon, Guevara, Ghandi, Chaplin já estão mortos.

Faltam grandes figuras.

Então pensei: serei menos exigente e vou procurar pseudo-heróis. Não adiantou. Nem no esporte, fábrica de pseudo-heróis, achei alguns que prestassem: Rogério Ceni está de muletas e Roger Federer não consegue mais passar nem das semi-finais.

Está difícil.

Se ainda fosse questão de meus heróis terem "morrido de overdose", estaria mais aliviado, pois me restaria a lembrança, o saudosismo.


Mas não, os heróis parecem estar escondidos.



foto DeviantART
Procurando...

domingo, 19 de abril de 2009

Considerações


Fiquei mais de uma semana sem postar aqui. Na verdade, a desculpa esfarrapada é que eu estava que nem esse cara aí na imagem de cima. Mas, don't worry! Estou de volta e, em breve, "Vou de ônibus - Capítulo 2" .

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Pequeno aviso

Manuel Bandeira





Temos modificações na coluna ao lado: sai de cena Manoel de Barros e entra outro Manuel(agora com "u"), o Bandeira. Poeta pernambucano, Bandeira sempre me atraiu pela sua simplicidade. Há lirismo e figuras imaginativas, assim como elementos prosaicos em sua poesia. Mas, quase sempre, necessariamente simples.


Sensacional!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Vou de ônibus - capítulo 1

foto de autoria desconhecida





Sexta-feira, à noite, lá pelas 23h. Ponto da Brigadeiro. Entro no ônibus, ainda relativamente vazio. Sento perto da porta de saída, no fundo.

Dois pontos depois, sobe no veículo uma mulher com seu filho- o menino devia ter uns 8 anos. Fogo nos olhos. Dava pra ver que o moleque devia ser daqueles bem pentelhos, um verdadeiro pestinha.

Ainda há lugar para os dois. A mãe senta, o menino não. Quer ficar em pé. Não demora muito para que o garoto comece a andar pelo ônibus. Inicia-se uma brincadeira um tanto quanto perigosa:

- Olha mãe! Quando o motorista para o ônibus eu seguro com uma mão só, olha!

- Tá bom, filho! Agora senta aqui do lado da mãe e sossega, pelo amor de Deus!

alguns minutos depois...

- Olha mãe! Consigo segurar só com 3 dedos. ( o pestinha tinha tirado o dedão e o "mindinho" da barra)

- Ai, filho! Você vai se machucar, vem pra cá, vem!

Vocês já devem ter sentido isso antes: sabe quando tá na cara que vai dar merda? Pois é...

- Mãe, vou tentar segurar com um dedo só. (deixa apenas o indicador segurando a barra)

Segundos depois, o motorista dá aquela brecada típica. Olho para o corredor e vejo um acontecimento cinematográfico, coisa de David Fincher: o endiabrado voa pelo ônibus e a cabeça dele vai de encontro à catraca.

- Wellington!!!!!!¹ Filho de Deus, eu te avisei!

O demônio de alguns minutos atrás vira um chorão, e deve-se dizer que não era qualquer choro, eram gritos de dor. Pelo que vi, não abriu nenhuma ferida, mas pude presenciar a formação de um galo instantâneo. A testa do garoto ficou deformada.

- É isso que dá não sossegar!

- Mãe, tá doendo muito!

- Ai, filho, aguenta aí! A mãe não pode descer agora, quando chegar em casa a gente coloca gelo, tá?

O interessante é que, na hora do acidente, pouquíssimas pessoas prestaram ajuda ao garoto. Claro, a mãe rapidamente levantou e não havia muito para fazermos mesmo, além de não ter sido nada grave. Mas foi hilário olhar as expressões das pessoas que não aguentavam mais as macacadas do menino. Uma garota, na minha diagonal, com fones no ouvido, parecia tentar esconder o riso, mas seus olhos a denunciavam: estava morrendo de rir por dentro. O senhor que lia jornal ao meu lado, balançava a cabeça afirmativamente, como se pensasse: "Isso mesmo, é isso aí!" As duas moças que pareciam ser colegas de trabalho, sentadas na minha frente, olhavam uma pra outra, dialogando pelo olhar: " É , amiga! Já tava demorando, tava imaginando que isso ia acontecer." Até o cobrador que estava 1/2 dormindo e 1/2 acordado pareceu ter ficado contente.

Mas o moleque não parava de chorar. Aqueles que pensaram "bem feito!", como eu, se arrependeram: preferiam o moleque fazendo travessuras do que gritando e chorando. E o choro continuava. Pensava: "poxa, já bati a cabeça forte quando era criança(caí da balança uma vez), mas duvido que fiquei chorando todo esse tempo, uma hora tem que passar a dor pô!" Alguns começaram a olhar com desconfiança, achavam que era frescura do garoto e que o choro verdadeiro agora tinha se transformado nas famosas "lágrimas de crocodilo." De qualquer forma, o pensamento dominante era: "Meu Deus! Em qual ponto essa mulher vai descer com esse moleque, pelo amor de santo Cristo!" A mulher não olhava para a janela, não levantava, não dava sinais de que seu ponto estava chegando. Vagarosamente, o choro foi diminuindo. Ou a dor estava passando ou a garganta do carinha cansou um pouco. Foi quando descobrimos que, talvez, o choro forte é melhor do aquele miado de 10 em 10 segundos:

- "Snif!".............................."Snif!"...................................."Snif!"................................."Snif!"

O choro fininho e irritante não estava mais diminuindo, parecia ter ficado constante. Alguns olhares para o menino não eram lá muito amistosos. Alguns ali gostariam que não houvesse catraca e que, assim, o pestinha tivesse sido arremessado para mais longe e outros queriam pegar o menino pela gola e arremessá-lo de novo contra a catraca.

Então, A MÃE DO GAROTO COMEÇA A DORMIR! O ônibus inteiro olhava e não acreditava. O pior foi que o peste, ao perceber que ela estava dormindo, parecia querer chamar a atenção da mãe e começou a chorar mais alto de novo. A mãe, ao invés de acordar e mandar o menino ficar quieto, continuava dormindo.

Um senhora, sentada atrás de mim, murmura alto: " Ai, ai, ai!" Mas não tem jeito, a mãe parecia estar no 18º sono. Pensei: acho difícil essa mulher chegar viva no ponto dela, o pessoal está começando a ficar furioso.

Chegou o meu ponto, desci.



1. Estou supondo a grafia do nome